Atualizado em: 19.07.22

 

A ampla divulgação de reportagens a respeito das fraudes em produtos cárneos, fazem com que tenhamos ainda mais atenção em relação ao que estamos consumindo, sua origem e sua produção. Para entendermos melhor essas fraudes, devemos saber quais os componentes que podem alterar ou danificar a carne que consumimos. E quais as análises microbiológicas que são de responsabilidade das indústrias de carnes.

Casos de impropriedade das carnes resfriada/congelada e processada consumida no país e exportada, já ocasionaram inúmeros cancelamentos de contratos, devoluções de carregamentos e muitos problemas e embargos para os produtos cárneos brasileiros.

Os meios de comunicação aliados a preocupação dos consumidores, passaram a cobrar maior transparência das autoridades competentes fazendo com que haja controles mais rigorosos, análises microbiológicas periódicas e exigência de certificação na hora da aquisição.

Fatores de deterioração da carne

Os principais fatores de deterioração das carnes se devem principalmente à temperatura, armazenamento e manipulação inadequadas. Esses fatores podem ser classificados de acordo com a atmosfera que os envolve e se a contaminação é provocada por bactérias, bolores ou leveduras.

Micro-organismos envolvidos na deterioração

Alguns micro-organismos envolvidos na deterioração das características sensoriais dos derivados cárneos são leveduras, bolores e as bactérias. Entre as bactérias pode-se citar Pseudomonas, Acinetobacter/Moraxella, Shewanella putrefaciens, Brochotrix thermosphacta, Lactobacillus e algumas espécies da Família Enterobacteriaceae, como as mais importantes.

Coloração da carne

Nos produtos cárneos, o fator responsável pela pigmentação se deve, principalmente, a duas proteínas a hemoglobina (pigmento do sangue) e a mioglobina (pigmento dos músculos + anel Heme). Os pigmentos da carne podem reagir com diversos substratos e resultar em alteração de cor.

Quando encontramos carne em tons de verde, marrom ou cinza, podemos entender que essa alteração na cor se deram devido à produção de bactérias de H2S (sulfeto de hidrogênio) e compostos oxidantes. Em carnes vermelhas processadas (ex. salsichas e carnes curadas) podem ocorrer dois tipos de esverdeamento, sendo um causado pelo H2O2 (peróxido de hidrogênio) e outro pelo H2S.

Essa alteração na coloração também ocorre em decorrência de micro-organismos naturalmente presentes do produto. Apesar de o Lactobacillus viridescens ser o micro-organismo mais comum nesse tipo de deterioração, outros também podem estar envolvidos, como Leuconostocs, Enterococcus faeciumEnterococcus faecalis. Por isso a temperatura e o tempo de cozimento se fazem tão importantes, para a eliminação desses micro-organismos.

Fraude em produtos cárneos

Em 2017 alguns casos de fraude noticiados, se deram por uso abusivo de antioxidantes, como ácido ascórbico e acido sórbico, autorizados e comumente usados na indústria de carnes em níveis pré-estabelecidos pela OMS. Porém só é permitido o uso desses aditivos em carnes embutidas, curadas e processadas, nunca em produto in natura.

Esses antioxidantes têm a função de estabilizar o sabor e evitar que a carne fique com cor escura. Em produtos in natura podem mascarar a oxidação além de, em doses excessivas, ser potencialmente cancerígeno colocando em risco a saúde do consumidor.

Outros tipos de fraude podem ser citados na indústria de carnes. Em um caso reportado em 2021, carne de cavalo estava sendo vendida como carne bovina. Neste caso, o Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal comprovou, após sequenciamento genético, que a carne comercializada em um estabelecimento de Santa Catarina continha carne de cavalo e de búfalo mistura da carne bovina.

Análises microbiológicas na indústria de carnes

O Ministério da Agricultura (MAPA) estabelece três micro-organismos patógenos para serem analisados com prioridade, são eles: Listeria monocytogenes, Escherichia coli e Salmonella.

Conheça abaixo um pouco mais sobre esses patógenos.

Escherichia coli

É uma bactéria bacilar Gram-negativa que se encontra normalmente no trato gastrointestinal inferior. A infecção causada pela E. coli pode ocorrer quando ela se multiplica no intestino e chega ao trato urinário ou através do consumo de água e de alimentos contaminados com a bactéria. Os sintomas da contaminação por E. coli vão depender da gravidade da doença e do local afetado.

Quando a E. coli infecta os intestinos pode haver:

  • Diarreia com ou sem sangue
  • Dor ao evacuar;

Quando o E. coli infecta o trato urinário pode haver:

  • Dor ou ardor ao urinar;
  • Dor nas relações íntimas.

Listeria Monocytogenes

De grande importância em termos de saúde pública, encontra-se neste gênero a espécie Listeria monocytogenes, causadora de importantes infeções (listerioses). Esta espécie apresenta bastonetes curtos, regulares, não esporulados, móveis por flagelos peritríquios, Gram positivos e anaeróbios facultativos. As infeções causadas por L. monocytogenes encontram-se normalmente associadas a carnes frescas, em particular carne de porco e frango, ao leite cru ou mal pasteurizado.

Os sintomas são muito parecidos com o quadro de meningite, podendo provocar abortos em grávidas infectadas. O aparecimento dos sintomas após a ingestão do alimento contaminado é variável e ocorre mais comumente em recém-nascidos e idosos.

Salmonella sp

Este gênero é constituído por bastonetes de 0,5 a 0,7 por 1 a 3 micrômetros, móveis por flagelos peritríquios, não esporulados, Gram negativos e anaeróbios facultativos. A Salmonella sp é capaz de sobreviver à acidez do estômago e chegar ao intestino, onde inicia o processo de infecção do organismo.

Os sintomas mais comuns da Salmonelose são diarreia, vômito, dores abdominais e febre baixa que geralmente aparecem entre 12 e 36 horas após a ingestão do produto contaminado, e não requer hospitalização. Porém, se os sintomas perdurarem por mais de 72 horas pode se tratar de contaminação por formas mais virulentas da bactéria, como a Salmonella typhi, que pode durar até oito semanas, causando septicemia e levando a morte.

Os principais alimentos passíveis de contaminação por esta bactéria são: carne (bovina ou suína), aves, ovos e leite contaminados.

O mercado brasileiro de fornecedores de produtos cárneos tem concentrado seus esforços em se ajustar às exigências impostas pelo mercado internacional.

Embora o pais já apresente a tecnologia e a expertise necessária para realizar as análises microbiológicas exigidas algumas falhas e impedimentos internacionais ainda são mais comuns do que gostaríamos. Assim, para adequar os produtos para exportação ainda temos que ultrapassar a barreira cultural de alguns empresários e produtores que lideram o mercado.


Se quiser entender melhor sobre os parâmetros exigidos pelas fiscalizações da ANVISA e do MAPA, confira os artigos nos links!

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Sobre a autora:

Tatiana G. Ianni é médica veterinária especialista em Higiene e Inspeção de Produtos de Origem Animal e Higiene Alimentar, com experiência em frigoríficos, entrepostos e auditorias de segurança alimentar”