Até pouco tempo atrás, entender quais fungos habitavam um ambiente — ou causavam uma infecção — dependia do cultivo e desenvolvimento desse microrganismo.
Com o avanço do sequenciamento de nova geração (NGS), essa limitação praticamente desapareceu. Agora é possível detectar e identificar DNA fúngico diretamente da amostra, sem precisar ver o fungo crescer. Essa mudança de paradigma abriu caminho para estudos e para diagnósticos muito mais rápidos e sensíveis.
O SEQUENCIAMENTO DE NOVA GERAÇÃO (NGS) E DETECÇÃO DE FUNGOS
A investigação e detecção fúngica, tradicionalmente, depende de métodos baseados em cultura. Por meio desses métodos, em que o microrganismo precisa ser isolado e cultivado em laboratório, análises morfológicas e bioquímicas são feitas para obter os resultados. Esse processo, além de demorado, é limitado pelo fato de que uma grande parcela dos fungos é não cultivável ou apresenta crescimento muito lento.
O advento do NGS rompeu essa barreira ao permitir que o DNA fúngico seja analisado diretamente a partir da amostra, sem a necessidade de cultivo.
Essa abordagem possibilita identificar fungos de maneira rápida, sensível e com alta resolução taxonômica, mesmo em comunidades complexas ou em situações em que a carga fúngica é baixa, como em amostras ambientais e hospitalares. Estudos recentes demonstram que o uso do NGS pode complementar ou até superar métodos como a cultura e a PCR em sensibilidade, especialmente em amostras onde o DNA fúngico está presente em baixa quantidade (Gu et al., 2019).
Dessa forma, o sequenciamento de nova geração consolidou-se como uma ferramenta indispensável para compreender o papel dos fungos em múltiplas escalas.
PRINCIPAIS TÉCNICAS UTILIZANDO NGS PARA DETECÇÃO DE FUNGOS
Entre as estratégias mais difundidas para detectar e identificar fungos por NGS está o sequenciamento de amplicons, também conhecido como metabarcoding.
Essa técnica baseia-se na amplificação de uma região específica do DNA ribossomal, o ITS (Internal Transcribed Spacer) que atua como uma espécie de “código de barras genético” para os fungos (Schoch et al., 2012). Na prática, o metabarcoding consiste em amplificar fragmentos do ITS a partir do DNA total extraído da amostra e realizar o sequenciamento massivo desses fragmentos. Essa abordagem tem a vantagem de ser rápida, relativamente barata e altamente sensível, sendo ideal para amostras como solo, ar, tecidos vegetais e secreções humanas.
Enquanto o metabarcoding foca em regiões específicas do genoma fúngico, a abordagem shotgun metagenomics vai além: ela consiste no sequenciamento direto de todo o material genético presente em uma amostra, sem etapas de amplificação direcionada. Nessa estratégia, o DNA total que inclui material de fungos, bactérias, vírus e até do hospedeiro é fragmentado e sequenciado em larga escala, permitindo uma análise abrangente de toda a comunidade microbiana.
Essa abordagem apresenta vantagens notáveis. Ela possibilita explorar aspectos funcionais, como genes associados à virulência, resistência antifúngica e interações metabólicas com outros microrganismos. Em estudos ambientais, a técnica tem sido empregada para investigar comunidades fúngicas em solos, oceanos, plantas e sistemas industriais, oferecendo uma visão integrada da ecologia microbiana e das funções desempenhadas pelos fungos nos ecossistemas (Tedersoo et al., 2021).
PERSPECTIVAS FUTURAS DA DETECÇÃO DE FUNGOS POR NGS
As abordagens baseadas em NGS transformaram o estudo e a detecção de fungos em múltiplos contextos. O metabarcoding, com seu foco em regiões-alvo como o ITS, consolidou-se como uma técnica versátil para estudos de diversidade e monitoramento ambiental, enquanto o shotgun metagenomics ampliou os horizontes ao permitir análises genômicas completas e funcionais.
O futuro da detecção fúngica por NGS aponta para uma integração cada vez maior entre tecnologias de sequenciamento, bioinformática avançada e inteligência artificial. Assim, a detecção de fungos caminha para uma abordagem mais complexa utilizando equipamentos modernos de sequenciamento, alinhados a grandes bancos de dados e máquinas analíticas capazes de aprimorar a classificação taxonômica e prever funções metabólicas dos fungos.
Referências
Gu, W., Miller, S., & Chiu, C. Y. (2019). Clinical Metagenomic Sequencing for Pathogen Detection. Annual Review of Pathology, 14:319–338.
Schoch, C. L., et al. (2012). Nuclear ribosomal internal transcribed spacer (ITS) region as a universal DNA barcode marker for Fungi. PNAS, 109(16):6241–6246.
Tedersoo, L., Tooming-Klunderud, A., & Anslan, S. (2021). PacBio metabarcoding of Fungi and other eukaryotes: errors, biases and perspectives. MycoKeys, 79:11–40.